quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Cony aos pedaços


Chega às livrarias de todo o país em maio, pela editora LeYa, o livro do jornalista e imortal Carlos Heitor Cony, “Eu, aos pedaços”. A obra reúne crônicas já publicadas sobre a vida pessoal e profissional de Cony.
 
Não são poucos que proclamam Carlos Heitor Cony um poeta do jornalismo. É, também, um grande escritor, intelectual ou boa praça. Mas o próprio personagem de si mesmo é como o início deste parágrafo: Cony tem mesmo qualquer coisa de indefinível.

Em seus textos, ao falar da infância ou de gostos particulares, sugere não dizer tudo. Até parece que gosta de fazer segredo. Mas não. O sentimento, a lembrança, o fato. Está tudo ali. “Grudei na cara várias máscaras, várias caras – e, se não obtive poder e glória, ao menos sobrevivi quieto e no meu canto, fazendo um tipo de Carnaval a meu modo, interior, doído, véspera de cinzas”, escreve.

Ao tratar de assuntos de ordem e progresso, por outro lado, os textos de Cony devem ser lidos com atenção. As palavras são ditas sem censura, mas mesmo assim é possível refletir a respeito dos dizeres claramente escritos. Como quando comentou sobre a instauração da ditadura, escrevendo: “O ato não foi um ato: foi um fato, fato lamentável mas que, justamente por ser um fato, já contém, em si, os germes do antifato que criará o novo fato”.

E assim, depois que se começa a entender a primeira pronúncia, basta acompanhar o desenvolver da trama e se surpreender com suas análises e observações da vida contemporânea. Em alguns, pode até doer. E que doa, em linhas gerais, e tumultue – para o bem ou para o mal – as mentes ainda adormecidas de muita gente.

Figura polêmica no cenário nacional, o escritor muitas vezes esteve no meio de embates, controvérsias, celeumas. O fato é que o jornalista, desde cedo na carreira, impressionou os colegas de profi ssão pela prosa curta e arrebatadora nos temas mais variados, que invariavelmente cutucava a célebre indecisão política dos anos dourados, de chumbo ou de qualquer outro quilate.

Nascido no Rio de Janeiro em 1926, coleciona desde o primeiro romance (O Ventre) títulos e prestígios que o levariam a receber, em 1996, o Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da obra. A personalidade irrequieta, contudo, não sossegou mesmo depois de tamanha homenagem. Pelo contrário, as palavras continuam a fluir com naturalidade e estilo.

À sua maneira, Cony, o cronista, o menino e o rebelde se encontram, em fragmentos, em seu livro mais recente, Eu, aos Pedaços, no qual, como o próprio afirma, “não se trata da costumeira edição de ‘100 crônicas escolhidas’ e muito menos das ‘melhores crônicas’ que nunca escrevi”. Os textos selecionados, sem ordem cronológica exata, narram os episódios e os momentos que mais o marcaram: infância, jornalismo, viagens e personagens são resgatados na prosa inquietante do imortal cronista.

Imortal, pois em março de 2000 Carlos Heitor Cony foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Como se suas palavras e episódios que se confundem com a história do país já não fossem suficientes para lhe conferir esse título de rara nobreza.

Fonte: Revista Vida Simples

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